A água é um bem estratégico e essencial em escala global, fundamental no âmbito doméstico, no abastecimento urbano e no ambiente agrícola. Mas, além de ser um recurso de uso cotidiano e inevitável, também desempenha um papel fundamental nos espaços industriais, onde é utilizado na produção e refrigeração de zonas ou máquinas e em trabalhos de limpeza e geração de energia.
O aproveitamento hídrico e a gestão responsável da água nos ambientes industriais não são apenas decisões estratégicas tomadas para melhorar a eficiência de uma atividade produtiva, mas também fazem parte de um compromisso compartilhado para reduzir seu impacto ambiental, sustentado por um rigoroso marco normativo.
Alberto del Villar García, professor do Departamento de Economia e Diretoria de Empresas e diretor do Mestrado em Hidrologia e Gestão dos Recursos Hídricos da Universidade de Alcalá, destaca os esforços que muitas indústrias estão realizando neste âmbito, especialmente na gestão de resíduos. “É aí que colocaram mais ênfase. É quase uma gestão descentralizada, porque fizeram grandes esforços para realizar os despejos em condições adequadas”, afirma.
Economia circular e sustentabilidade
Usar a água de forma sustentável, favorecendo a economia circular e a sustentabilidade, é um dos grandes objetivos do setor industrial. Tanto é assim que, nos últimos trinta anos, as empresas deixaram de ser as grandes poluidoras. “Há ainda alguns pontos pendentes, mas elas têm aproveitado seus próprios recursos para reutilizar e regenerar suas águas previamente utilizadas, principalmente por rentabilidade econômica, já que reduzir a dependência de recursos melhora seus resultados financeiros, permitindo gerar uma entrada de qualidade”, explica Del Villar. Algumas indústrias fizeram grandes investimentos que, além de reduzir custos, lhes proporcionaram águas de melhor qualidade do que a fornecida pelos sistemas de abastecimento. Conscientes da necessidade de também minimizar seu impacto ambiental, adotaram estratégias que não comprometem sua produção: “Praticamente qualquer indústria que dependa da água e tenha despejos significativos busca o vertido zero: tudo o que pode ser reutilizado, é; e, quando despeja sua carga no esgoto, ela está em condições bastante adequadas, até melhores que a média das residências, com baixa carga poluente, com técnicas de eliminação de nitrogênio, metais pesados ou substâncias químicas que cumprem com essa expectativa”.
Essas estratégias, além de protegerem o meio ambiente e suas finanças internas, visam preservar sua reputação: “Há trinta ou quarenta anos, uma empresa com despejos era algo ignorado, mas hoje é manchete de jornal. É relevante para sua imagem, para suas campanhas de comunicação, publicidade etc. É um forte dano à reputação, e elas cuidam muito disso”, alerta o especialista.
Normas para proteger o meio ambiente
Para minimizar a poluição e os despejos dessas águas, a União Europeia estabeleceu diversas normas nas últimas décadas, desde a Diretiva 271 de Tratamento de Águas Residuais dos anos 1990 até a Diretiva-Quadro da Água (DQA) de 2000. “Agora temos outras normas da UE: temas de nitratos, contaminação emergente etc. Tudo isso foi transposto para a normativa espanhola; não se aplica apenas à Espanha, envolve toda a Europa”, explica Del Villar.
A normativa europeia é muito abrangente e estabelece parâmetros que vão desde limites de emissões até a qualidade dos despejos, o que resultou em melhorias ambientais significativas em comparação com décadas passadas. Para isso, foi preciso enfrentar novos problemas, como os poluentes emergentes. “Há certas substâncias que podem ser nocivas ao se incorporarem à cadeia trófica e chegarem aos nossos corpos. Esse é o próximo passo que estamos dando”, aponta.
Sistemas de reciclagem
O aproveitamento dos resíduos faz parte da economia circular, que Del Villar ilustra com um exemplo prático: “Quando a mangueira do meu avô estragava, ele não jogava fora, consertava. Hoje fazemos o mesmo: aproveitamos os resíduos em outras atividades. O lixo de uma pessoa é o tesouro de outra.” Os despejos domésticos costumam conter nitrogênio e fósforo que são usados na agricultura, e as águas residuais podem ser extraídas, regeneradas e usadas para irrigar cultivos.
Outra técnica importante é a dessalinização. “Nas águas dessalinizadas, o custo de produção da água potável gira em torno de um euro, mas o que se despeja de volta no mar, todos os sais, contém produtos que valem quase dez euros. Ou seja, vale mais o que estamos descartando do que o que estamos aproveitando. “Se conseguíssemos aproveitar tudo o que descartamos, surgiriam novas possibilidades para a humanidade”, aponta o professor Del Villar.
Novas tecnologias
Para otimizar a gestão hídrica, atualmente foram abertas interessantes linhas de inovação e estudo: “Na dessalinização, estão sendo utilizadas tecnologias de membrana, e já estão sendo feitos experimentos para ir além das membranas, com tecnologias ainda muito iniciais, mas com menor consumo energético”, explica Del Villar. Atualmente, empregam-se tecnologias em processos químicos para regenerar e depurar águas residuais de forma mais rápida, além de tecnologias biológicas que melhoram os sistemas por meio do uso de bactérias especiais, capazes de avançar ainda mais na degradação dos poluentes nas estações de tratamento. Cada situação, no entanto, exige uma técnica distinta. “Para tratar as águas de uma cidade como Madri, eu não cogito tecnologias leves baseadas em sistemas extensivos de baixo consumo energético; já em um município pequeno, com poucos habitantes, essa é a solução mais adequada. Instalar uma grande estação de tratamento geraria mais problemas. Não podemos falar no que é mais eficiente, e sim no que é mais adequado.”
Nas últimas décadas, o setor alcançou avanços muito significativos. “Cinquenta anos atrás, ninguém imaginava que seria possível reaproveitar águas residuais, e hoje há regiões como Múrcia onde 99% dessas águas já estão sendo regeneradas e reutilizadas. Implantamos a dessalinização há cinquenta anos na Espanha para fornecer água potável a uma ilha como Fuerteventura, que não tinha água, e agora essa estratégia resolve muitos problemas.” Tentar prever como o setor vai evoluir no futuro, segundo o professor Del Villar, ainda é um exercício arriscado.
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Alberto del Villar García é professor do Departamento de Economia e Direção de Empresas e diretor do Mestrado em Hidrologia e Gestão dos Recursos Hídricos da Universidade de Alcalá. Sua pesquisa tem se concentrado na análise de mecanismos de preços, custos, ferramentas de análise econômica, fiscalidade e financiamento dos serviços de água, o que o levou a participar de diversos projetos e contratos de pesquisa, tanto como colaborador quanto como pesquisador principal. O resultado desse trabalho tem se traduzido em participações em congressos e publicações de caráter científico e técnico. Desde 2002, atua como especialista em diversos grupos de análise relacionados à água e no processo de planejamento hidrológico decorrente da implementação da Diretiva Quadro da Água na Espanha.
