Julia Maria Gomez de Avila Segade | 16/10/2025
As jornadas Global Risks em Bilbao surgiram há dois anos com o objetivo de consolidar um espaço de debate sobre riscos relevantes para o setor segurador no País Basco.
No dia 23 de setembro, foi realizada a segunda edição das Jornadas Global Risks em Bilbao, onde foram compartilhadas reflexões sobre temas atuais e apresentados os pontos-chave para abordar os desafios da transição energética sob uma perspectiva seguradora.
Transição energética e gestão de riscos: desafios e oportunidades para o setor segurador
A transição energética avança com força na Espanha. Em 2024, 57% da geração de eletricidade adveio de fontes renováveis e seu objetivo é alcançar 75% até 2030. No entanto, há regiões que enfrentam barreiras geográficas e climáticas que limitam sua capacidade de geração renovável. Apesar disso, o País Basco é sede de muitos grupos investidores, industriais e de serviços que atuam nesse setor.
Este cenário traz desafios significativos para o setor segurador, que precisa se adaptar a um ambiente regulatório, tecnológico e financeiro em contínua evolução.
Os projetos renováveis estão sujeitos a uma série de riscos complexos e dinâmicos. Entre os principais fatores que determinam sua viabilidade e segurabilidade, destacam-se:
- O desenvolvimento do marco regulatório e seu impacto no financiamento.
- A constante inovação em equipamentos, que dificulta contar com históricos de sinistralidade e custos de reparo.
- A mudança climática e os eventos catastróficos associados.
- A instabilidade das taxas de juros.
- O ingresso de fundos de investimento com expectativas específicas de retorno.
- As tensões nas cadeias de suprimentos e a ausência de mão de obra especializada.
Esses elementos demandam uma gestão de riscos proativa e colaborativa, na qual clientes, brokers e seguradoras trabalhem em conjunto para identificar, quantificar e mitigar os riscos desde as etapas iniciais do projeto.
O papel do broker como assessor estratégico
Nesse novo paradigma, o broker deixa de ser um mero intermediário para se converter em um assessor estratégico. Sua participação na fase de elaboração e negociação contratual possibilita harmonizar as cláusulas de cobertura com os requisitos de financiamento e as necessidades operacionais do cliente. Este trabalho é particularmente relevante diante da integração de novas tecnologias, como sistemas de armazenamento com baterias e a internacionalização dos projetos.
O seguro nos projetos renováveis: Construção e operação
A gestão dos seguros em projetos renováveis exige um planejamento detalhado entre as etapas de construção e operação. Embora a MAPFRE geralmente opte pela separação de apólices, existem soluções mistas no mercado. A transição entre etapas pode criar áreas indefinidas que devem ser abordadas com clareza contratual, delimitando períodos de cobertura, participantes envolvidos e procedimentos de certificação de obra.
Instalações renováveis antigas: um nicho com potencial
O mercado segurador se depara com o desafio de adaptar seus produtos a instalações renováveis com mais de 20 anos de uso. Essas infraestruturas, embora baseadas em tecnologias fora de linha, apresentam perfis de risco mais conhecidos e controláveis. A repotenciação avança lentamente na Espanha, o que ressalta a importância de antecipar a gestão de peças de reposição e ajustar as coberturas às demandas específicas deste segmento.
Gestão de riscos catastróficos e programas internacionais
No âmbito global, a gestão de riscos catastróficos (CAT) se torna especialmente complexa. A colocação de coberturas em mercados exigentes requer experiência técnica e assessoria especializada. A escolha entre soluções locais ou programas globais deve ser fundamentada na localização e na complexidade do projeto, sempre com o respaldo de modelagens de risco que justifiquem os limites requeridos pelos financiadores.
Melhoria no gerenciamento de sinistros: protocolos e presença técnica
A melhoria contínua no gerenciamento de sinistros é um objetivo compartilhado por todos os agentes do setor. Combinar previamente os protocolos de ação e os fluxos de comunicação permite agilizar a resposta e evitar desentendimentos. A presença física dos responsáveis técnicos e do broker no local do sinistro é essencial para obter informações em primeira mão e acompanhar o cliente em momentos cruciais.
As sessões de análise pós-sinistro são um instrumento valioso para detectar oportunidades de melhoria em procedimentos, coberturas e comunicação, contribuindo para a evolução do setor rumo a uma gestão de riscos mais eficaz e resiliente.
Riscos em instalações fotovoltaicas: design, execução e manutenção
Os sinistros em instalações fotovoltaicas costumam ter origem em falhas de design, erros de montagem e deficiências na manutenção. A correta realização técnica e o cumprimento de padrões são vitais para evitar incidentes elétricos e mecânicos que possam comprometer a integridade das instalações, bem como o risco de incêndio.
A proteção contra incêndios em instalações fotovoltaicas exige uma abordagem integral. Entre as recomendações, destacam-se:
- Projeto adequado da instalação.
- Instalação de sistemas de detecção e extinção de incêndios.
- Evitar a instalação de painéis fotovoltaicos em coberturas com painel sanduíche inflamável
- Supervisão e rigor técnico em todas as etapas do projeto.
Essas medidas possibilitam reduzir o risco de incêndio, melhorar o tempo de resposta e limitar sua propagação.
Normas e padrões: em busca de uma regulamentação mais eficaz em sistemas fotovoltaicos
As normas espanholas de cumprimento obrigatório oferecem margem para melhorias no desenho e na instalação dos sistemas fotovoltaicos, já que, em algumas situações, não incluem proteções específicas para os riscos inerentes a eles. Por isso, recomenda-se:
- Aplicar padrões internacionais reconhecidos.
- Cumprir à risca os manuais dos fabricantes.
- Evitar práticas inadequadas, como instalar acessórios ou componentes não recomendados pelo fabricante da instalação fotovoltaica.
- Contratar empresas especializadas em projeto, instalação e manutenção.
A tecnologia fotovoltaica não é perigosa em si, mas seu risco aumenta consideravelmente quando o projeto, a instalação, a manutenção e as inspeções são negligenciados.
Baterias de íon-lítio: riscos específicos e gestão técnica
As baterias de íon-lítio tornaram-se a tecnologia de baterias mais utilizada em várias áreas, incluindo automotiva, geração de energia, comunicações, indústria e outras aplicações, inclusive no ambiente privado.
As baterias de íon-lítio apresentam riscos singulares, como o fenômeno do thermal runaway, que pode provocar incêndios difíceis de controlar e/ou explosões. Para mitigar esses riscos, recomenda-se de forma geral e conforme seu uso:
- Qualidade dos materiais e da fabricação
- Gestão adequada das baterias ao longo de seu ciclo de vida.
- Uso de software de gestão das baterias (BMS), com bloqueios de segurança.
- Isolar/separar adequadamente as áreas onde as baterias estão situadas.
- Instalar sistemas de detecção precoce “off gas” com bloqueios de segurança.
- Instalar sistemas de detecção e extinção.
- Realizar vistorias técnicas periódicas.
A complexidade desses sistemas demanda a intervenção de especialistas desde a etapa de projeto, bem como uma supervisão contínua durante a operação.
É importante destacar que são sistemas em contínua evolução tecnológica, o que representa um grande desafio, não apenas para a prevenção e a proteção, mas também para a engenharia de riscos.
Conclusões
Os especialistas concluem que a transição energética exige atenção completa em todas as etapas do projeto, desde o design até a operação, tanto em grandes plantas quanto em instalações de autoconsumo. A colaboração entre seguradoras, brokers, clientes e especialistas técnicos é vital para se adiantar a possíveis riscos, aplicar boas práticas e ajustar as coberturas às características de cada projeto.
Ainda, o mercado segurador é incentivado a continuar inovando e evoluindo, adaptando seus produtos e processos aos novos desafios tecnológicos. A escuta ativa às necessidades dos clientes e a participação na avaliação técnica de riscos serão fundamentais para consolidar uma transição energética segura e sustentável.
