Cristina Leon Vera | 14/08/2025
A instabilidade, a crise climática e os riscos geopolíticos estão em alta. Empresas em todo o mundo estão redesenhando seus mapas de produção em busca de aliados e proximidade geográfica como escudo frente aos novos desafios.
O tabuleiro geopolítico é extremamente dinâmico: onde antes havia segurança agora há ameaças, e vice-versa. As empresas deixaram de se perguntar onde poderiam produzir com maiores margens e passaram a avaliar onde podem operar com menores riscos. Em um cenário marcado por conflitos bélicos, rivalidades entre países e efeitos pós-pandemia, estratégias como produzir em mercados aliados (friendshoring) ou aproximar a produção de mercados-chave (nearshoring) se consolidam como pilares da gestão.
Desde 2020, diversos eventos globais impactaram o mundo: a pandemia de Covid-19, tensões comerciais entre China e o Ocidente, sobretudo com os Estados Unidos, a guerra na Ucrânia e um grande número de eventos climáticos extremos. Isso levou as corporações a buscar novas formas de adaptação. A resposta se repete em todos os setores: diversificar, aproximar-se e buscar alianças.
De acordo com um estudo publicado pela Bain & Company em 2024, 80% dos executivos de operações globais planejam ampliar a realocação produtiva para países aliados. O objetivo é claro: evitar riscos, tanto reputacionais quanto logísticos.
Nearshoring: mais perto e mais seguro
Nearshoring significa transferir a produção para países próximos ao mercado final. Suas vantagens incluem redução de custos e prazos de transporte, maior capacidade de reação a disrupções e menor pegada de carbono. Nos últimos anos, vimos exemplos como o México se consolidando como parceiro comercial dos EUA, ou Marrocos, Polônia e Turquia tornando-se destinos preferenciais para a Europa.
Contudo, o nearshoring não está isento de desafios: falta de mão de obra especializada em algumas regiões menos desenvolvidas, infraestrutura limitada, marcos regulatórios distintos e até riscos locais específicos.
Friendshoring: produzir com aliados
Em 2021, a então presidente do Banco Central dos EUA, Janet Yellen, cunhou o termo friendshoring. Ele se refere à deslocalização, mas apenas em países considerados aliados confiáveis. Embora não exija proximidade geográfica, requer estabilidade política e jurídica.
Exemplos visíveis são a diversificação da produção da Apple para Índia e Vietnã ou a promoção da autonomia estratégica europeia com aliados como Canadá, Coreia do Sul e Japão.
Apesar de parecer mais segura, a estratégia de friendshoring também envolve riscos. Segundo o FMI, sua expansão pode fragmentar o comércio global em blocos de “amizade” e reduzir o crescimento mundial. Barreiras comerciais, custos mais altos e interrupções nas cadeias de suprimento fazem parte do preço.
Modelos híbridos: a aposta intermediária
Para mitigar riscos e ganhar resiliência, cada vez mais empresas apostam em modelos híbridos que combinam friendshoring, nearshoring e split-shoring (divisão de operações entre regiões). Essa mistura permite diversificar sem romper por completo a cadeia de suprimento tradicional.
Isso não significa cortar laços com países como a China, onde muitas empresas concentram sua produção, mas adicionar novas localizações para evitar dependências críticas.
Como explica o CESEDEN (Centro Superior de Estudos de Defesa Nacional) em sua monografia “A nova globalização e as oportunidades com a Ibero-América”, esse processo está levando a uma nova globalização fragmentada, o que exige repensar a geoeconomia corporativa. As cadeias resilientes já não podem se limitar a ser eficientes, mas precisam ser robustas e estratégicas.
Esses modelos híbridos reúnem o melhor dos dois mundos:
- Redução do risco: ao evitar dependência de regiões instáveis.
- Menores custos logísticos: graças à proximidade física.
- Segurança regulatória: aliados tendem a compartilhar normas e tecnologias.
- Maior adaptabilidade: flexibilidade para responder a interrupções como pandemias ou conflitos.
Um novo mapa empresarial
Neste cenário, a América Latina está emergindo como uma grande oportunidade. Países como Chile, México, Uruguai ou Costa Rica despontam como destinos ideais. Conforme o Fórum Econômico Mundial, o friendshoring pode oferecer “benefícios enormes para impulsionar o crescimento da América Latina e do Caribe”.
Por sua vez, A Espanha aumentou sua presença empresarial no México, buscando alianças tecnológicas e produtivas impulsionadas por acordos bilaterais e comunitários. Isso é demonstrado pela Associação de Empresas de Eletrônica, Tecnologias da Informação e Telecomunicações em seu artigo “México e Espanha: uma aliança estratégica em tempos de friendshoring e reconfiguração geopolítica “.
Adaptar-se para prosperar
Estratégias como o friendshoring ou nearshoring se consolidam como respostas sustentáveis diante de um ambiente global marcado pela incerteza. Além de reduzir riscos, reforçam a colaboração entre países parceiros, favorecendo a estabilidade, a eficiência e a segurança.
A era da deslocalização focada unicamente em custos baixos ficou para trás. Agora, a resiliência logística e a afinidade política são os novos eixos das decisões empresariais.
Neste contexto, as companhias que conseguirem se adaptar e diversificar estrategicamente não só prosperarão na nova ordem econômica, mas também liderarão o futuro da produção global.
