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O desafio atual da gestão hídrica nas grandes cidades

Julia Maria Gomez de Avila Segade | 23/05/2023

A água é um bem imprescindível e transversal para o desenvolvimento econômico e o bem-estar social. A gestão hídrica nas grandes cidades, com a tensão demográfica e os eventos climáticos adversos, tem representado um autêntico desafio para autoridades e especialistas no assunto.

As grandes cidades mudaram drasticamente nas últimas décadas, e isso também afetou, de forma muito positiva, a gestão hídrica. Após a revolução industrial, os modelos urbanos podiam ser catalogados como rígidos, com um alto componente de concreto. “Este tipo de urbanismo caracteriza-se pela impermeabilização das superfícies existentes, de forma que, onde antes existia uma grande extensão de terra capaz de absorver água, agora nos encontramos com a mesma superfície onde só temos pequenos embornais pelos quais a água da chuva pode escorrer para chegar à rede de esgoto”, acrescenta Carmen Hernández de la Vega, coordenadora técnica da AEAS (Associação Espanhola de Abastecimento de Água e Saneamento).

Em um contexto de mudança climática, onde os fenômenos extremos são cada vez mais frequentes e intensos, as cidades vêm se adaptando, integrando elementos que protejam a infraestrutura e garantam a continuidade da vida nas cidades e muitos deles se inspiram na própria natureza. “Essas mudanças de paradigma estão permitindo uma renaturação das cidades, proporcionando inúmeros benefícios como os pavimentos permeáveis ou as zonas de enchente”, explica a especialista.

 

Ambientes de maior impacto

Uma política de gestão hídrica eficaz e sustentável melhora substancialmente a qualidade de vida nas grandes cidades, já que garante o fornecimento em épocas de seca e atenua as enchentes. Essas medidas afetam de forma ainda mais relevante os municípios médios e pequenos, que são os que têm maiores problemas diante desse tipo de dificuldades.

“Neste caso, podemos nos gabar de que a Espanha foi pioneira na gestão da água através de confederações hidrográficas”

“Se falamos de gestão da água, é importante realizá-la no nível de bacia hidrográfica e, pouco a pouco, ir pormenorizando, já que qualquer atuação ou impacto pode ter repercussões a jusante da mesma. Neste caso, podemos nos gabar de que a Espanha foi pioneira na gestão da água através de confederações hidrográficas”, afirma Hernández de la Vega.

Outro desafio importante para as organizações responsáveis pela gestão hídrica é o caso das chuvas extremas, eventos variáveis e cada vez mais frequentes. Para evitar transbordamentos de água, as infraestruturas atuais contam com “vertedouros” externos que despejam o excedente que não conseguem gerenciar.

Embora essa medida seja eficaz, a frequência desses episódios alertou as autoridades; por isso já estão sendo procuradas outras soluções complementares como, por exemplo, as grelhas e elementos de retenção de resíduos volumosos, que impedem a saída de materiais grandes nos derramamentos, bem como a existência de tanques de tempestade que permitem o armazenamento.

 

A situação da Espanha

Quando falamos de gestão hídrica em escala nacional, é necessário consultar o sexto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS6) da Agenda 2030 adotada pela ONU em 2015, cujas metas mais relevantes são assegurar o acesso universal à água potável, melhorar a qualidade dos recursos hídricos e reduzir a escassez que enfrentamos como planeta.

“É necessário lembrar que o país atravessa atualmente uma seca severa com pouca precipitação”

“Um dos pontos mais importantes é o acesso à água e pode-se afirmar que na Espanha está garantido. De fato, uma das coisas que permite e assegura o urbanismo e a ordenação do território é a conexão de todas as moradias. Se houvesse um problema em nosso país, não seria por falta de conexões, mas sim por falta de água ou pela qualidade da mesma”, assinala a especialista.

No entanto, é necessário lembrar que o país atravessa atualmente uma seca severa com pouca precipitação, diante da qual a AEAS propõe um correto planejamento hidrológico, juntamente com planos especiais adequados de seca, que só podem ser abordados com previsão, detecção precoce e agilidade na tomada de decisões e medidas de resposta. Para isso, a associação recomenda colocar a água em uma posição prioritária dentro da agenda política a fim de conseguir o investimento necessário para enfrentar o seu impacto e otimizar as infraestruturas altamente sobrecarregadas, melhorando a sua qualidade.

 

Os maiores desafios futuros

Atualmente, o maior desafio da gestão hídrica sustentável na Espanha está relacionado com a escassez de água, situação cada vez mais grave pelo aumento da demanda, da urbanização do solo e da agricultura intensiva. Diante dessa situação, Hernández de la Vega considera imprescindível implementar o mais cedo possível políticas públicas e estratégias para melhorar o manejo deste recurso no longo prazo.

Na AEAS, dois textos legislativos recentes seguem esse caminho, pois ampliam as obrigações e requisitos que o setor deve cumprir. São eles o Real Decreto que trata da Diretiva de Águas de Consumo Humano – aprovado pela administração estatal – e a revisão da Diretiva de Águas Residuais Urbanas – pela Comissão Europeia.

O principal desafio é o aumento das exigências, pois envolve um maior esforço econômico em um contexto onde encontramos grandes inconvenientes, como:

  • Falta de renovação da infraestrutura.
  • Aumento dos custos de energia e do IPC.
  • Uma tarifa muito abaixo da média europeia.
  • Gestão hídrica fora da agenda política.

“Somos um país com escassez de água no nível estrutural e cada vez mais a aridez vai se espalhar, então não podemos nos permitir continuar neste cenário. Precisamos avançar para manter o setor de água urbana sustentável. Assim, conseguiremos manter os padrões de qualidade, que até agora caracterizaram um serviço essencial e vital para a sociedade, a economia e o meio ambiente”, conclui a coordenadora técnica da AEAS.

 

Colaborou neste artigo:

A Associação Espanhola de Abastecimentos de Água e Saneamento (AEAS) é uma organização sem fins lucrativos que representa os operadores públicos e privados do setor de água na Espanha por meio de atividades, publicação de estudos e diretrizes técnicas.

Entre seus principais objetivos estão promover a melhoria contínua da gestão de água, fomentar a colaboração entre os diferentes atores do setor e contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas que assegurem o acesso e a higiene da água.

 

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