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Inovação e sustentabilidade: como reduzir as emissões na aviação

A descarbonização dos setores estratégicos é um objetivo prioritário das grandes economias. Indústrias como a da aeronáutica se apoiam na inovação para reduzir suas emissões. Falamos disso com Elena Rodríguez, Responsável por I+D+I no Centro Tecnológico AIMEN.

Por que descarbonizar o setor da aviação é um desafio tão complicado? Qual é o contexto em que nos encontramos?

À medida que as economias e as populações crescem, a demanda por bens aumenta, bem como o número de pessoas que os desejam e os meios para viajar. No mundo inteiro, espera-se que a atividade total do transporte mais do que dobre até 2050, em comparação com 2015. Qualquer avanço tecnológico na descarbonização do setor da aviação seria simplesmente compensado pelo aumento da procura de mobilidade.

A aviação representa atualmente 2% das emissões mundiais de CO2 e 3,8% das emissões na União Europeia. No entanto, o crescimento previsto do tráfego aéreo triplicará as emissões globais até 2050.

No contexto de um compromisso mundial para reduzir drasticamente o impacto no meio ambiente, a UE estabeleceu objetivos ambiciosos (como a neutralidade climática até 2050), que foram adotados na aviação, obrigada a adotar rápida e amplamente uma nova geração de aeronaves com melhorias decisivas de rendimento. Trata-se de um desafio complicado, já que afeta toda a cadeia de valor da fabricação de aviões, tanto no desenvolvimento de estruturas mais leves, com novos desenhos e materiais, como de sistemas de propulsão mais sustentáveis. Soma-se a isso a forte inércia de um setor em introduzir mudanças em seus processos de certificação, sempre muito tediosos, que levam muitos anos de desenvolvimento e, portanto, são muito caros. Projetos de I+D como o Caelestis contribuem para introduzir tais mudanças, com base em novos conceitos de desenho de componentes leves e novas maneiras de fabricar, a partir da perspectiva digital.

Gostaríamos de falar mais especificamente deste projeto europeu, o CAELESTIS, do qual a AIMEN participa. Quais são os primeiros passos?

A ideia parte da necessidade de garantir uma digitalização integral da cadeia de valor da indústria europeia. Isso permitirá otimizar os processos de fabricação e acelerar a certificação das estruturas aeronáuticas, exigências dos novos compromissos em sustentabilidade e eletrificação.

O CAELESTIS, projeto liderado pela AIMEN, ligará os softwares de desenho, simulação e engenharia distribuídos ao longo da cadeia de valor para agilizar o intercâmbio de informações e explorar a capacidade dos supercomputadores nos ciclos de otimização baseados em simulação. Tudo isso é validado por um estudo de caso concreto que demonstra como as estruturas das aeronaves se tornam mais leves e como sua fabricação otimizada diminui as etapas da manufatura com processos automatizados e avançados. Assim, será desenvolvido um novo conceito de OGV (da sigla em inglês para outlet-guide vane), um componente de motor que será multimaterial, leve, combinando processos de fabricação aditiva com processamento de compósitos fora da autoclave.

Quais são os objetivos principais do projeto?

O objetivo fundamental é permitir que indústria aeronáutica da União Europeia desenhe e fabrique motores e estruturas de aeronaves disruptivas, com capacidades de predição melhoradas, para ampliar o espaço de desenho e reduzir as incertezas. Tais incertezas, potencialmente encontradas na engenharia e ao longo do ciclo de vida do produto, limitam seu funcionamento atual.

Fale dos diferentes participantes do plano e do mapeamento que representam.

O projeto começou em maio de 2022, com duração total de 42 meses. É formado por onze parceiros localizados em oito países da Europa. São empresas, centros e universidades cuja experiência se divide em:

  • Renderização e simulação do rendimento mecânico e de processos de fabricação.
  • Sistemas de interoperabilidade, computação de alto rendimento, inteligência artificial e cibersegurança.
  • Sistemas adaptativos e de fabricação inteligente para componentes compostos e multimateriais.
  • Difusão, comunicação, exploração, gerenciamento da propriedade intelectual e de dados.
  • Fabricação de motores para aeronaves.

Quais são os principais desafios enfrentados?

A iniciativa encontra-se em sua primeira fase, na qual foram definidos os requisitos do projeto. Tais requisitos procurarão melhorar e encurtar a chegada das peças da indústria aeronáutica ao mercado. Visamos solucionar esse desafio com base na digitalização e nos protótipos virtuais.

Com este objetivo, desenvolveremos um Ecossistema de Simulação Interoperável (ISE, na sigla em inglês) que permitirá o fluxo bidirecional de dados entre as diferentes etapas do desenho e a fabricação de peças aeroespaciais. O objetivo é acelerar a fase de desenho e otimizar a produção, assegurando a viabilidade da fabricação das peças e otimizando o desenho.

Este sistema interoperável contará com os seguintes desenvolvimentos:

  • Um fio digital que ligará as fases de desenho, simulação e fabricação das peças aeroespaciais, estabelecendo entre elas um fluxo de dados bidirecional.
  • Gêmeos digitais baseados em modelos do desenho e na fabricação das peças, considerando e gerenciando a incerteza proveniente dos processos de fabricação.
  • Sistemas de computação de alto desempenho (High Performance Computing, HPC, na sigla em inglês) que executarão as simulações do processo de fabricação e o comportamento da peça.
  • Sistemas de fabricação inteligente, de monitoramento e controle de processos que analisarão e reduzirão o impacto dos defeitos no comportamento da peça em serviço.

 

Poderia nos dizer em que momento se encontra a pesquisa e quais são os avanços alcançados?

Até o momento, os requisitos dos desenvolvimentos e demonstradores do projeto foram definidos, e desenhos preliminares dos demonstradores e da arquitetura dos sistemas de simulação foram feitos. Além disso, haverá desenvolvimentos para extrair os dados de fabricação e implementá-los nos diferentes modelos de simulação.

O objetivo é que entre os modelos se produza uma comunicação, definida na arquitetura do sistema de simulação e cujos resultados sejam validados em comparação com os resultados reais obtidos na fabricação.

Atualmente, trabalhamos para conseguir um primeiro fluxo de dados virtuais entre os modelos de simulação e para gerar dados reais com a fabricação de ensaios.

Por outro lado, preparamos o novo desenho do OGV para tornar mais leve a versão atual, propondo novos materiais compostos, introduzindo a fabricação aditiva, evoluindo os processos automatizados e avançados para fabricar a estrutura multimaterial (compósito-metal).

 

Quais são as expectativas para próximo ano?

O projeto avançará até utilizar os dados reais da fabricação no sistema de simulação e validar as soluções de simulação com os resultados reais. Tudo isso estará apoiado com sistemas de computação de alto desempenho (HPC) para executar as simulações, e com algoritmos de inteligência artificial para criar dados sintéticos que enriqueçam as simulações e proponham soluções de desenho alternativas e otimizadas.

No próximo ano, esperamos conseguir este fluxo de dados reais obtidos na fabricação no sistema de simulação. Nos meses seguintes do projeto as simulações serão otimizadas até que sejam validadas usando os dados reais de processos e ensaios.

Quanto à redução de emissões no setor, que perspectivas há agora e quais são os atores mais importantes em seu sucesso?

Para 2035, três promissores tipos de aviões de propulsão alternativa oferecem opções viáveis aos convencionais que emitem carbono. Aviões totalmente elétricos, com baterias, permitem um voo completamente livre de emissões nas distâncias mais curtas.

O hidrogênio, por sua vez, pode ser utilizado para eletrificar as aeronaves com pilhas de combustível em distâncias médias, ou mediante combustão direta. Esta última pode ser aplicada a qualquer aeronave que percorra as distâncias atuais.

 

Perfil da entrevistada

Elena Rodríguez Senin é responsável pela Unidade de Negócio e Coordenadora de Materiais Avançados no Centro Tecnológico da AIMEN. Licenciada em Química em Santiago de Compostela, na Galícia, entrou em contato com o mundo da Engenharia de Materiais em Madri, onde se doutorou na Universidade Carlos III em 2006.

Pouco depois, ingressou na AIMEN, onde começou como técnica júnior e, em 2014, foi nomeada Coordenadora da Unidade de Materiais Avançados na área I+D, cargo que ocupa atualmente.

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