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Os desafios do setor portuário na América Latina

Falar agora do setor portuário latino-americano, é falar do futuro. Em particular, seus portos enfrentam um importante desafio de evolução tecnológica para superar a exclusão digital que os afasta dos principais portos do mundo. Jorge Durán, chefe da Secretaria da Comissão Interamericana de Portos (CIP), conversa sobre o roteiro das principais instituições da região em direção a alcançar um sistema portuário competitivo, seguro, sustentável e inclusivo.

A Organização dos Estados Americanos (OEA), dentro do âmbito de desenvolvimento integral, inclui a Comissão Interamericana de Portos (CIP) que, como fórum governamental, reúne todas as Autoridades Portuárias Nacionais dos Estados Membros da OEA e mais de 50 membros do setor privado e internacional. “Isto representa uma grande variedade não só regional, mas de modalidade. Por exemplo, México acabou de transpassar todos os portos para a Secretaria de Marinha, o que convocou novos interlocutores militares, almirantes, etc.”, explica Jorge Durán, chefe da Secretaria da CIP, que acrescenta que seu principal objetivo é conquistar um setor portuário competitivo que seja seguro, sustentável e inclusivo. Além disso, e diante dos recursos limitados da instituição, eles têm como desafio “o trabalho de fortalecer as capacidades institucionais portuárias dos países membros através da capacitação do capital humano no mais alto nível. Nesse âmbito, no ano passado, por exemplo, 403 bolsas foram oferecidas para funcionários de 29 países do hemisfério. Isso é um número muito importante”, assevera o líder.

 Situação antes da crise sanitária

 Em 2019, a movimentação de contêineres na América Latina e no Caribe experimentou volume similar ao do ano anterior, superando 54,2 milhões de TEUs (unidade correspondente a uma caixa metálica, contêiner, de tamanho padronizado de 20 pés quadrados, que pode ser transferida facilmente entre diferentes formas de transporte como navios, trens e caminhões). Este número representa somente 6,5% da movimentação total de contêineres no mundo. “Quando falamos em volume, é importante considerar que o porto que mais movimenta é Colón, no Panamá, com aproximadamente 4,3 milhões de TEUs. O porto mais ativo do mundo, Xangai, movimenta cerca de 40 milhões. Falamos de uma magnitude dez vezes maior”, assinala Durán, contextualizando os números a nível mundial. “Às vezes, as pessoas me perguntam como vamos fazer para alcançá-los? Minha resposta é que a meta não deve ser atingir esses números, porque somente na China há 1,3 mil milhões de pessoas. Em toda a América Latina e o Caribe, apenas alcançamos 600 milhões. O que deveríamos fazer é comerciar melhor entre nós”, acrescenta.

Dentro da região, dez países contribuem de forma proeminente para o volume total (em 2019, segundo dados da Comissão Econômica para América Latina e Caribe das Nações Unidas-CEPAL, superaram 80% de contribuição). Esses países, em ordem de maior a menor, são: Brasil, Panamá, México, Chile, Colômbia, Peru, Equador, República Dominicana, Argentina e Jamaica. No entanto, e com relação aos portos, a ordem procedente altera-se. “O primeiro porto, como indiquei acima, é Colón, no Panamá, seguido bem de perto por Santos, no Brasil”, assinala.

Fonte: Cepal

Relativamente à situação de qualidade da infraestrutura portuária, Durán acredita que o sistema se encontra em um bom ponto de partida, com amplo percurso de melhoria.

Conforme explica Durán, este contexto prévio à COVID-19 apresentava um cenário positivo, embora as previsões devessem ter sido examinadas. Apesar de que a pandemia não afetou de forma direta o setor, e de que os portos continuaram funcionado durante o confinamento para prover os países de insumos sanitários e bens necessários, o reflexo da crise foi evidente nas previsões da CEPAL. De uma previsão de crescimento de 3,6% do comércio de contêineres no mundo, no último trimestre de 2019, para 2,5% em janeiro de 2020, passando para -4,9% em abril e -9% em maio do mesmo ano. No entanto, e conforme dados do mesmo órgão, a movimentação no primeiro semestre do ano 2020 em Santos, a maior zona portuária do Brasil, incrementou-se em 10,6%, enquanto o total da região atingiu 4,2% no mesmo período de tempo. Outras regiões, como Panamá, exibiram um crescimento semelhante, enquanto 26 portos da América Central, o Caribe, COAS e México apresentaram baixa média na produtividade. “A nível mundial, os portos nunca fecharam, nunca permitiram que a pandemia evitasse o fluxo de mercadoria. Nós, na CIP, incluímos no portal diretrizes, protocolos e recomendações emitidos pela Organização Marítima Internacional (OMI) e por vários governos da região, e ainda temos um guia sobre como realizar a gestão portuária com a máxima segurança para evitar contágios”, assegura. Quanto à recuperação para níveis prévios à pandemia, o líder da CIP nos remete ao contexto. “Em que ponto da recuperação nos encontramos? Naquele em que está a economia nacional. Nossa própria rede nunca deixou de funcionar. E se a economia da região não tivesse diminuído seu nível, os portos também não teriam reduzido a atividade. Conforme as economias vão se recuperando, o setor continuará atendendo”.

Relativamente à situação de qualidade da infraestrutura portuária, Durán acredita que o sistema se encontra em um bom ponto de partida, com amplo percurso de melhoria. “Segundo a última classificação do Banco Mundial, Panamá até recebe uma melhor qualificação do que os Estados Unidos, em uma fórmula que considera população e território. Também Jamaica, República Dominicana, Honduras, Salvador, Guatemala e Nicarágua têm boas posições”, apesar de mencionar que ainda se encontram a mais de 30 posições de uma lista liderada pelos portos da Ásia e da Europa. “Mas isto nos diz que existe espaço para crescer e que há coisas que já estão mudando. Existem novas tecnologias que possibilitarão atrair navios com maior envergadura, que ainda não alcançam todos os portos da América Latina. Além disso, há países como México, Jamaica ou Colômbia que estão se posicionando como hubs para receber mega navios, descarregar e depois rotear por transporte marítimo de curta distância ou por outros meios, como trem e estrada, adicionando valor ao conjunto da região”, expõe.

Um setor com trajeto tecnológico

Como em tantos setores, as restrições impostas durante a crise sanitária impulsionaram uma evolução que se encontrava emergente. “A pandemia acelerou vários processos e obteve a integração tecnologia digital no dia a dia, precisamente para evitar o contato físico, reduzindo a quase nada a burocracia e as formalidades presenciais. Vínhamos de uma dinâmica em que os portos da América Latina e do Caribe estavam se modernizando, mas no último ano foi efetuado um enorme esforço tecnológico”, explica Durán. Com este ponto de partida nasce o principal desafio enfrentado pelos portos da região: a capacitação tecnológica no mais alto nível. “Os portos da América Latina e do Caribe estão imersos em um processo de digitalização. Almejam um balcão marítimo único, sem papéis, e conformar o que denominado PCS (Port Community System): uma plataforma em que todos os atores da gestão portuária estão comunicados ao mesmo tempo. Nela é possível encontrar o armador, o agente, o vendedor, o comprador, a autoridade portuária, o transportador, etc. Assim, há economia de tempo, dinheiro e esforço que podemos acrescentar um tratamento digital com toda a segurança do mundo,” explica Durán. Apesar de ser o próximo passo na evolução tecnológica, não será o último. “É nosso grande desafio, mas falamos da terceira geração de portos. A quarta geração, em que estão Hamburgo, Xangai ou Roterdão, é chamada de Smart Ports, que fazem uso de tecnologias como GPS ou Blockchain no nível que, por exemplo, o porto de Hamburgo cogita dobrar suas operações para 2024 sem comprar um metro quadrado de terra nem estender seus planos. Este incremento será realizado exclusivamente através de eficiências de tempo e movimentação”, explica.

A pandemia acelerou vários processos e obteve a integração da tecnologia digital no dia a dia, precisamente para evitar o contato físico, reduzindo a quase nada a burocracia e as formalidades presenciais.

Cultura do risco

Os portos estão incorporando a consciência de que, conforme são digitalizados, precisam assegurar-se. E para isto há duas estratégias: a primeira é preventiva. Contar com bons componentes de cibersegurança em sua plataforma tecnológica para se proteger contra a pirataria, monitorar firewall e prevenir malwares. Mas também reativa. E é aqui onde entram essas grandes seguradoras da América Latina que precisamente tentam entrar em acordos.

Pela peculiaridade da América Latina e do Caribe, são muito conscientes dos imprevisíveis acontecimentos meio ambientais, como erupções vulcânicas ou furacões, que podem afetar as infraestruturas, questão que tornou os responsáveis muito cuidadosos nessa questão. “No setor, a partir do 9/11, criou-se o código PBIP (que significa código de proteção de navios e instalações portuárias) focado na infraestrutura física, cais, navios, terminais, armazéns e na interface navio-portos. Os profissionais são muito conscientes destes riscos e contam com boas apólices”, assevera. Além disso, na CIP são muito conscientes de que o avanço tecnológico envolverá uma exposição a novos riscos, como a pirataria informática, que podem estar dirigidos a clientes, empresas ou portos. “São precisamente esses riscos, porque a região está fazendo um esforço de digitalização, que são muito considerados”, explica. “Os portos estão incorporando a consciência de que, conforme são digitalizados, precisam assegurar-se. E para isto há duas estratégias: a primeira é preventiva. Contar com bons componentes de cibersegurança em sua plataforma tecnológica para se proteger contra a pirataria, monitorar firewall e prevenir malwares. Mas também reativa. E é aqui onde entram essas grandes seguradoras da América Latina que precisamente tentam entrar em acordos. Porque, repito, este é um tema novo para os portos. Não necessariamente todos eles possuem experiência e estão apenas dando seus primeiros passos a nível regional, ainda que haja portos mais avançados”, afirma.

Neste, como em todos os avanços, o chefe da Secretaria da CIP aposta pela coordenação entre as diferentes autoridades, apesar de confessar que o nível de concorrência é um grande fator a ser levado em consideração. “Estamos em uma fase em que há temas que as autoridades portuárias sabem que devem ser trabalhados em conjunto. No entanto, a grande maioria dos portos foram concessionados para o setor privado e têm interesses comerciais muito pontuais, e enquanto exista um push a nível regional para digitalizar em conjunto, ficará muito claro que os portos começarão a concorrer entre eles para ganhar esses postos de hubs especializados,” confessa. Partindo desta situação, Durán olha para outros portos da Europa, como os belgas de Antuérpia e Zeebruge, que se uniram em um único ente chamado Antwerp-Bruges para incrementar sua competitividade. “Esta é a combinação que idealmente focaríamos, mas nossa região ainda está dando os passos para ter as ferramentas tecnológicas necessárias que eventualmente permitirão essa coordenação”, finaliza.

Colaborou neste artigo…

Durante mais de 30 anos, Jorge Durán colaborou com os governos e o setor privado nas Américas no design e execução de projetos de desenvolvimento na América Latina e o Caribe. Trabalhou na Organização de Estados Americanos (OEA) desde 2003 como assessor principal em Tecnologia para o Desenvolvimento, gerente principal de Desenvolvimento Municipal e Capacitação, diretor do Escritório de Ciência, Tecnologia e Inovação e, desde 2013, como secretário da Comissão Interamericana de Portos (CIP) da Secretaria para o Desenvolvimento Integral (SEDI).

Anteriormente, ele foi vice-presidente de Assuntos Internacionais (2000-2002) e diretor da Cooperação Regional (1995-2000) no Instituto Latino-Americano de Comunicação Educativa (ILCE) na Cidade do México. Outros cargos desempenhados incluem assessor no Conselho Consultivo de Ciências da Presidência do México (1990-1992) e assistente especial do embaixador do México na ONU (1994).

Durán também foi professor associado no Tecnológico de Monterrey (1997-2000) e na Universidade Ibero-Americana (1995-1997), e conta com mestrados em Relações Internacionais e Política Científica e Tecnológica da Universidade George Washington e diplomas em Psicologia e Estudos Latino-Americanos da American University, em Washington DC, onde reside atualmente com suas duas filhas.

 

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