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Rosa Menéndez – Presidente do CSIC

“Ao comemorar um ano como presidente do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC), Rosa María Menéndez López fala nesta entrevista sobre seu compromisso com o desenvolvimento do talento científico na sociedade, os novos desafios em matéria de pesquisas, energia e gestão de recursos naturais, bem como da importância de divulgar o trabalho realizado pela agência estatal.”

1.       Atualmente, quais são seus objetivos à frente do CSIC?

Meu principal desafio é que a pesquisa realizada em nossos 120 centros, e em todas as áreas da ciência, consiga se consolidar e alcançar maior impacto social. Tudo isto mantendo e reforçando a excelência científica e técnica, que são nossas características.

O CSIC é a primeira instituição em pesquisa do país e nona no mundo, com mais de 10 mil artigos publicados anualmente em revistas internacionais de primeira ordem. Meu propósito é aumentar o impacto tecnológico e liderar mais iniciativas internacionais.

Para isso, e em primeiro lugar, apoiamos a participação de pesquisadores em múltiplas iniciativas, principalmente europeias, e também promovemos a colaboração entre grupos de diferentes especialidades, um dos grandes potenciais do CSIC. Além disso, atendimento especial recebe o investimento em infraestruturas e equipamentos de laboratório, incluindo a renovação de alguns dos centros mais relevantes.

Outra prioridade é aumentar de maneira significativa a colaboração do CSIC com o setor privado, tanto mediante acordos com grandes companhias quanto com PME, que possibilitem a criação de novas empresas de base tecnológica.

Finalmente, através da oferta pública de emprego, que teve um incremento em 2018, desejamos atrair os melhores pesquisadores jovens, incluindo aqueles que desejam retornar à Espanha. Para alcançar tudo isto, é importante consolidar nossa estrutura legal, administrativa e as ferramentas de gestão.

 

O CSIC é a primeira instituição em pesquisa do país e nona no mundo, com mais de 10 mil artigos publicados anualmente em revistas internacionais de primeira ordem.

2.       Pode destacar um dos projetos mais interessantes que o CSIC realiza atualmente?

Preciso assinalar que o CSIC tem cerca de 3 mil projetos de pesquisa em andamento, muitos deles de grande relevância nacional e internacional. Por exemplo, neste momento posso mencionar estudos sobre vacinas para doenças humanas e resposta imune, tumores e plasticidade celular, atmosferas em outros planetas, materiais supercondutores para aplicações de energia, ou sobre neurodegeneração, fibrose renal, câncer de cólon, altos níveis de ozônio, resistência a antibióticos, arqueobotânica, evolução demográfica, etc. Também desejo citar projetos aplicados em probióticos, aquacultura, solos, uso de exoesqueletos e aplicações robóticas, por citar alguns exemplos.

 

3.       Foi gestora do Plano de Energia, o que a Espanha precisa nessa matéria?

Neste momento, em plena transição para um modelo com maior componente de energia renovável, há muitos pontos chave a cobrir principalmente relacionados com a pesquisa e a inovação. Por um lado, encontra-se o aproveitamento integral da energia solar e eólica, que requer de um replanejamento cuidadoso da distribuição e de um melhor conhecimento do consumo. Por outro, alcançar um mecanismo de armazenamento de energia a grande escala, que permita cobrir períodos de menor consumo e melhorar a qualidade do fornecimento. Este é um tema muito relevante para o CSIC, que trabalha em parceria com o setor privado, e em especial na tecnologia de baterias de fluxo redox, que permitem um número muito elevado de recargas e escalabilidade muito alta.

 

Na área industrial, projetamos soluções no contexto da economia circular, que incluem a reutilização de materiais e da própria energia.

4.       A Espanha apóia o objetivo europeu de 34% em renováveis para 2030 e de 33% em eficiência energética. O que acha deste compromisso?

Somos um dos países melhor posicionados na Europa para consegui-lo, principalmente graças às condições naturais: contamos com grandes possibilidades em matéria de energias solar e eólica, e possuímos o complemento da energia hidrelétrica. Respeito do compromisso com a eficiência energética, talvez nem todos conheçam os trabalhos realizados no próprio CSIC em lares eficientes, mas temos certeza de que é um objetivo realista.

Na área industrial, projetamos soluções no contexto da economia circular, que incluem a reutilização de materiais e da própria energia.

 

5.       No referente à pesquisa, entendemos que alguns pontos estratégicos tomam como base a mudança global e os recursos hídricos. Porque eles são temas preferenciais e como afetam tanto o meio ambiente quanto à sociedade?

A mudança global é um grande desafio para nossa sociedade. Não podemos esquecer que todos vivemos no mesmo planeta, mas o ritmo de consumo dos recursos naturais e de impacto no meio ambiente que possuímos na sociedade ocidental não pode ser ampliado a todos sem colapsar. Os impactos diretos no clima, como o aquecimento global pelo incremento de CO2 , o uso do solo com a extensão das monoculturas, o desflorestamento ou até a desertificação e a escassez de recursos hídricos, são temas preferenciais porque incidem em nossa riqueza como planeta habitável e rico em biodiversidade e, portanto, em nosso futuro. Como sociedade, deveríamos poder alcançar um equilíbrio entre os recursos e seu aproveitamento, mas também garantir o acesso a uma boa qualidade de vida para toda a população. Se não conseguirmos isso, as consequências sociais, econômicas e políticas serão enormes.

 

6.       Outro ponto estratégico é o envelhecimento e a qualidade de vida. Quais são as repercussões sociais desses fatores e como acredita que podem ajudar a mitigá-las a biomedicina e a biomecânica?

Garantir uma boa qualidade de vida durante um período cada vez mais extenso é um desafio. No CSIC, do ponto de vista puramente assistencial, trabalhamos para melhorar os medicamentos e as técnicas que possibilitam reduzir o impacto de doenças neurodegenerativas como Parkinson ou Alzheimer e, em geral, realizar um diagnóstico melhor e precoce. Isso inclui dispositivos de assistência a partir da Biomecânica, que está conectado com nosso sistema nervoso e motor. Também, é fundamental melhorar a alimentação e, nesta área, temos grupos que promovem uma plataforma para alcançar uma melhor dieta.

Em uma perspectiva de longo prazo, outros equipamentos tentam entender o mecanismo de morte celular e seu envolvimento no envelhecimento.

Há 10 anos, o CSIC estabeleceu o projeto LINCGLOBAL “Laboratório Internacional em Mudança Global”, uma iniciativa inovadora de integração e colaboração científica de longo prazo em ciências de mudança global entre pesquisadores do CSIC e da América Latina.

7.       Segundo as pesquisas do CSIC, o fator internacional é chave; sabemos que na Europa fazem parte da construção do Espaço Europeu de Pesquisa. Mas na América Latina, quais vias de colaboração foram estabelecidas e em quais programas comuns participam?

A internacionalização do trabalho científico é outra de minhas prioridades. Efetivamente, o CSIC participou sem interrupções em todos os Programas Marco de Pesquisa europeia desde o início, em 1984. Em alguns desses projetos, vias de colaboração com países latino-americanos foram abertas. Porém, a cooperação com a América Latina se sustenta com recursos próprios, mediante chamadas anuais para financiar intercâmbios com países receptores de Ajuda Oficial ao Desenvolvimento, através dos projetos i-COOP e ao resto dos países, não incluídos nessa lista, mediante os projetos i-LINK. Há 10 anos, o CSIC estabeleceu o projeto LINCGLOBAL “Laboratório Internacional em Mudança Global”, uma iniciativa inovadora de integração e colaboração científica de longo prazo em ciências de mudança global entre pesquisadores do CSIC e da América Latina, que foi iniciado conjuntamente com a Universidade Católica do Chile e que teve a recente incorporação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

 

8.       Agora que as empresas, em função dos desafios da transformação digital, apostam pela inovação (o setor de seguros investiu mais de 160 bilhões de euros nos últimos 5 anos), como entende a relação entre instituições públicas e empresas em matéria de pesquisa?

A transformação digital teve e tem um componente muito importante de inovação, mas também uma prévia, crítica, de pesquisa. Para mencionar um exemplo: a pesquisa atual em técnicas básicas como a aprendizagem profunda (Deep Learning) é realizada em multinacionais que desejam explorar seu impacto em atividades como o reconhecimento automático de textos e voz, ou o design de assistentes inteligentes. Mas, este é só um primeiro passo.

As empresas europeias deveriam apostar por reforçar a colaboração com instituições públicas. Nesse sentido, o CSIC está totalmente aberto à colaboração, desde que represente um claro benefício social.

Big Data permite uma exploração profunda da informação pessoal, com objetivos nem sempre nobres, e a conjunção com áreas genericamente consideradas antes como a robótica: por exemplo, a direção autônoma. Isto criará uma nova revolução.  O problema é que as instituições públicas estamos perdendo esta corrida, mesmo em pesquisa básica, devido aos enormes investimentos necessários e ao impulso do setor privado. Mas isso também envolve uma concentração desse conhecimento nas mãos de multinacionais ou de grandes potências como a China, algo que em geral não é desejável.

 

As empresas europeias deveriam apostar por reforçar a colaboração com instituições públicas. Nesse sentido, o CSIC está totalmente aberto à colaboração, desde que represente um claro benefício social.

 

9.       Que setores esta relação poderia ser mais produtiva?

Para começar, um dos primeiros é o setor de seguros. O impacto da transformação digital ainda tem muito caminho por percorrer, especialmente na hora de criar novas estratégias de qualidade de vida e para todos os níveis: de planejar mobilidade a considerar a melhoria dos sistemas de assistência para grupos desfavorecidos. Também trabalhamos com setores como o de produção primária, onde abrangemos da implantação de robôs agrícolas à abordagem de uma indústria sustentável.

 

10.       Finalmente, em quais projetos o CSIC deseja colocar o foco nos próximos anos?

Por um lado, o CSIC está envolvido nas grandes iniciativas mundiais, como os novos detectores para o Large Hadron Collider, do CERN, ou na iniciativa SKA (Square Kilometer Array), em astrofísica, por mencionar dois exemplos muito relevantes. Na Europa, destaca-se sua participação nas iniciativas INSTRUCT, biologia estrutural, LifeWatch, biodiversidade e EMSO de observação marinha.

 

Apesar de que agora estamos realmente empolgados com nossas “Plataformas Temáticas Interdisciplinares (PTI)”, que contam com um enfoque de “missão” e nas quais participam ao mesmo tempo vários centros do CSIC com empresas e grupos de Universidades, como a plataforma SUSPLAST em gestão sustentável de plásticos, a plataforma QTP de Tecnologias Quânticas (onde será implantado o segundo Hub de computação quântica na Europa), a SOILBIO, que mudará a forma de fertilização dos solos, e outras muito específicas que já estão apresentando resultados, como a que deterá o avanço da praga Xylella Fastidiosa, que ameaça nossas oliveiras.

Também, gostaria de destacar dois novos projetos europeus de excelência: Synergy do ERC, que liderará o CSIC, apesar da necessidade de aguardar alguns dias para tornar pública esta ótima notícia.

Por último, o CSIC está impulsionando na Espanha a Ciência em Aberto: um projeto chave para recuperar o controle e a exploração do conhecimento gerado por nossos pesquisadores, desde as publicações até os dados gerados nos projetos, e que abre novas possibilidades nesta sociedade do século XXI.

Rosa Menéndez – Perfil

Rosa María Menéndez López é Presidente do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC), cargo que assumiu em novembro de 2017. Desde 1986, ela é Doutora em Química pela Universidade de Oviedo e começou seu trajetória no CSIC através do Instituto Nacional do Carvão (INCAR) da capital asturiana.

Em sua extensa carreira científica, tem participado em mais de 30 projetos de pesquisa, sendo responsável em 23 oportunidades, nove delas no âmbito europeu. Além disso, a cientista publicou mais de 200 matérias em revistas internacionais de alto impacto, é autora de dez patentes e dirigiu 18 teses de doutorado.

Não é a primeira vez que a asturiana, nascida em Cudillero, assume tarefas de responsabilidade e gestão. Desde 2003 até 2008, ela dirigiu o Instituto do Carvão e posteriormente foi vice-presidente de Pesquisa Científica e Técnica do CSIC. Além disso, desempenhou-se como avaliadora e coordenadora de vários Programas de P+D da União Europeia, bem como gestora do Plano Nacional de Materiais e do Plano Nacional de Energia. De fato, seu trabalho como cientista esteve sempre ligado aos materiais de carbono, com que iniciou linhas de pesquisa sobre grafeno para aplicações que incluem biomedicina e armazenamento de energia.

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